CADERNO DE VIAGENS - suplemento de "Aparas de Escrita"

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quinta-feira, outubro 25, 2007

AINDA SOBRE O ROUBO DO ROLEX

A antropóloga Alda Zaluar, coordenadora do Núcleo de Pesquisas da Violência da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, para quem a justiça social não foi feita pelo assaltante, afirma (página 93 da revista "Época", edição 491, de 15 de Outubro p.p., Brasil): "O que o bandido ganhou com a venda do Rolex provavelmente já foi perdido para a Polícia ou para o traficante".
É curiosa (e muito preocupante) esta subtil, mas nem por isso menos afirmativa e verdadeira, identificação entre polícia e traficante, identificação sentida, porque vivida, pela população, e que os responsáveis policiais não se atrevem a refutar com veemência, ou, pelo menos, a desdizer com sorriso amarelo. É que não há coragem para argumentar contra provas cabais.
Todos os dias, literalmente, os telejornais nos confrontam com notícias de assaltos, sequestros, roubos, furtos, fraudes, homicídios envolvendo como protagonistas agentes da Polícia, de uma qualquer das inúmeras (e ineficazes) Polícias que se espalham pelo Brasil. As autoridades mandam abrir inquéritos, o que não passa de folclore para responder à comunicação social. Depois, tudo cai no esquecimento. Funciona o espírito corporativista que alimenta a impunidade.
Hoje, no Brasil do dia-a-dia, é difícil saber quem é o polícia e quem é o bandido. Como insinua (com razão) a antropóloga atrás referida, estas duas figuras justapõem-se nesta sociedade, generalizações à parte, porque há honrosas, embora não muitas, excepções.
E a prova mais cabal desta promiscuidade entre polícias e bandidos (a minha segunda observação) vem estampada na página 91 da mesma revista. "O policial (...), investigador do 36º DP [Distrito Policial], no Paraíso (zona sul), afirmou saber onde está o Rolex roubado. A razão alegada para não investigar o caso e prender os ladrões seria o baixo salário que ele recebe" (...).
O facto de a Corregedoria da Polícia Civil de São Paulo ter decidido investigá-lo, podendo daí resultar advertência, suspensão ou demissão, não suaviza o comportamento do agente, agravado pela sua expressão pública. O pretexto de baixo salário para não fazer cumprir a Lei a infractores é crime pior.
Esta atitude, esta estrutura mental do investigador (investiga o quê, afinal) é uma pré-disposição para pactuar com os criminosos – a fim de arredondar o salário – e constitui uma mensagem clara para o mundo do crime: "paguem-me vocês melhor, e terão a minha protecção". Muitos polícias já foram apanhados em flagrante de conluio com malfeitores. Sempre a posteriori. Mas a priori, e com tal desfaçatez, penso nunca ter acontecido.
Das duas uma: ou o agente deixou escapar a afirmação inadvertidamente, como um lapso, o que já é mau porque retrata o seu carácter e a forma como cuida da deontologia da sua profissão, ou, mais grave ainda, a afirmação foi feita em plena consciência, certo, também ele, da impunidade que impera no país.
O cidadão que lhe paga o salário, por mais baixa que seja esta retribuição (não é aqui nem agora a sede própria para debater o tema), ficou, assim, a saber do estado do moral e da moral da Polícia, e, além disso, em que lado da barricada se encontra essa Polícia.
Cabe perguntar: em quantas partes se divide um Rolex?...



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