No dia 17 de Agosto, um dos noticiários da noite da tv brasileira apresentou uma reportagem aparentemente inócua, misturada em caldeirada de notícias e baboseiras, que chamou a minha atenção.
Numa rua do Rio de Janeiro, a tal cidade maravilhosa de postal ilustrado para exportação, quando o semáforo do cruzamento passa para o vermelho e os carros param, ladrões correm de assalto e, com pedras ou marretas, partem os vidros de veículos conduzidos por mulheres para lhes roubar as bolsas.
Depois, com o maior à-vontade, com a maior segurança, com a maior desfaçatez fogem com o roubo para uma abertura de acesso à rede de esgotos subterrâneos.
Esta abertura, perpendicular à estrada, porta perfeita para qualquer Ali-babá, a avaliar pelas imagens dadas pela reportagem tem metro e meio de largura por oitenta centímetros de altura.
Em entrevista a que não conseguiu furtar-se, embora lhe conviesse que o julgassem invisível, o chefe da polícia responsável por aquela área declarou às câmaras da televisão, isto é, a milhões de espectadores, por palavras hesitantes e esgares e trejeitos de mentiroso, que o túnel era um perigo por ser escuro (pelos vistos a polícia desconhece um utensílio chamado lanterna) e porque os agentes poderiam ser mordidos por um rato ou por uma cobra.
Vejam só a graça que isto tem!... Gatunos descalços e seminus não temem ratos nem cobras que possam passear pelo túnel. Polícias armados com bastões, pistolas e espingardas, fardados, com coletes à prova de bala e botas grossas, militares, têm medo de possíveis ratos e cobras.
Se a polícia tem medo do escuro, de ratos e de cobras, qual não será o medo que terá dos bandidos... Mas, se tem medo do escuro, por que não patrulha a área iluminada do semáforo onde os assaltos ocorrem?
Se os bandidos não têm medo do escuro, nem de ratos, nem de cobras, nem de polícias, têm medo de quê?
Estamos perante mais um número de circo, igual a tantos outros com que o Brasil nos contempla todos os dias.
O mais provável e credível (tanto mais que os assaltados não querem gravar depoimentos com medo de represálias) é que polícias e ladrões, no fim do dia, confraternizem na orgia obscena da divisão dos roubos praticados. Resta saber quem fica com a maior parte – polícias ou ladrões? Resposta fácil.
O Brasil já não é só conhecido pelo pouco conceituado rótulo de país do Carnaval. É conhecido, também, e principalmente, como o país da carnavalesca corrupção impune e tolerada, senão mesmo acarinhada, pelos órgãos do Poder.