CADERNO DE VIAGENS - suplemento de "Aparas de Escrita"

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terça-feira, junho 13, 2006

JUÍZO DE UM JUIZ

Negar a cidadania portuguesa a alguém, sob o pretexto de que esse alguém não sabe o hino nacional, parece, no mínimo ridículo. Mas, e acima de tudo, é abusivo e atentatório da dignidade do requerente. Eu, conhecedor apenas quanto baste de matéria jurídica, mas mantendo íntegra a minha capacidade de pensar, tenho o dever, como cidadão português, de colocar algumas questões sobre o assunto, para as quais peço respostas, desde já agradecidas, seja quem for que mas possa dar.
Primeira questão: Em que clausulado, e de que qual Lei, portuguesa, da UE, ou de outra qualquer fonte credível, o douto juiz se apoiou para a sua decisão? Ou será que não existe Lei, e que a atribuição de nacionalidade reside no poder discricionário de um qualquer juiz, dependente, ele próprio, da pressão de lobbies, de dispepsias, de humores, de preconceitos, de pesadelos?
Segunda questão: O que entende o douto juiz por Cultura Portuguesa? É uma pergunta que me parece pertinente, na medida em que os conceitos de Cultura e de Cultura Portuguesa têm fronteiras fluidas, tão fluidas quanto o que se pode encontrar de Cultura Portuguesa nos quatro cantos do mundo, incluindo o rectângulo Portugal e essa longínqua Índia. O que é Cultura para o douto juiz pode ser, para outros cidadãos, pura alienação.
Terceira questão: Como define o douto juiz a identificação, seja com o que for, em particular com as suas ideias? Identificar-se com a Cultura Portuguesa pressupõe o quê? As nacionalidades atribuídas por esse mundo fora, incluso a portuguesa, têm tido sempre em conta esta identificação? Olhe lá!...
Quarta questão: Eu desconhecia que é condição sine qua non para ser Português saber o hino nacional. Como não encontrei qualquer disposição sobre o tema na Constituição da República Portuguesa, fiquei, primeiro, apreensivo; depois, alarmado. Se isso é remetido para os omissos... É que eu não sei o hino. Verdade, verdadinha. Do hino português só conheço o refrão e a primeira estrofe das três que o Henrique Lopes de Mendonça escreveu inspirado na "Marselhesa". E agora? Estarei f..., f..., perdão, até gaguejo, estarei feito? Isto é, estarei feito apátrida, estarei feito um cidadão uniãoeuropês, vago, difuso, perdido, se o tal douto juiz souber que também eu, aos quase 60 anos, também eu, bruto, não sei o hino nacional?
Quinta questão: Se, humildemente, pedir ao douto juiz que me ensine todo o hino nacional português, será que ele o sabe? E se o souber, será que poderá deferir o meu pedido, a minha solicitação, a minha pretensão, o meu requerimento, seja lá o que for?
Sexta questão: não conheço as razões invocadas pela mulher indiana no seu querer ser portuguesa – o que, dantes, sem perguntar razões, seria motivo de orgulho para Portugal. No Brasil, vão conceder nacionalidade a filhos e netos de portugueses. Será que ela também tem ascendência portuguesa, mas, ao contrário dos brasileiros, não dispõe de dólares para depositar nos cofres portugueses?
Sétima questão: Será que o homenzinho, não o douto e Meritíssimo juiz, mas o homenzinho que se abriga à sombra da toga que o estatuto lhe confere, será que esse homenzinho é racista?
Acabadas as questões, de que espero resposta, quero desejar longa vida e felicidade à mulher indiana que gostaria de fazer de Portugal o seu país de lei, já que, ao que parece, o é já de coração. No entanto, como o coração é cego, ela que não se esqueça de que países há muitos, alguns, bastantes, bem melhores – e com outros juízos.



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