CADERNO DE VIAGENS - suplemento de "Aparas de Escrita"

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terça-feira, novembro 01, 2005

AS BRUXAS ANDAM À SOLTA HÁ MUITO TEMPO

Halloween, aquilo que é hoje uma animada festa conhecida em português por Noite das Bruxas, significa "véspera do dia de Todos os Santos". Como tal, tem lugar em 31 de Outubro. Teve lugar ontem, portanto.
De origem que remonta a muitos séculos atrás, o que chega até nós é uma mistura já adulterada de tradições cristãs e pagãs.
No cristianismo arcaico, ela representava a vigília da festa de Todos os Santos, em que se homenageavam os eleitos da corte celeste que não tinham dia próprio no calendário.
Nos ritos pagãos, identificava-se, por um lado, com o Festival da Colheita, que os Romanos realizavam em honra da sua deusa das frutas, Pamona, e, por outro, com o Festival Druida de Samhain.
Foi principalmente desta faceta que a Noite das Bruxas colheu os seus elementos da folia dos nossos tempos. Mas, em épocas ancestrais, as coisas não eram assim tão engraçadas.
Segundo a lenda, nesse dia, Samhaim, o Senhor da Morte e Príncipe das Trevas, reunia as almas dos que tinham morrido durante o ano para as levar para o céu dos druidas, os sacerdotes celtas. Isso marcava, simultaneamente, o fim do Verão e o fim do ano céltico.
Os druidas invocavam, então, forças sobrenaturais para aplacar os espíritos malignos, e acendiam fogueiras no alto dos montes, de modo a que as almas pudessem orientar-se no caminho das casas onde iam procurar calor e mantimentos para fazer face ao Inverno que se aproximava.
Bruxas, fadas, duendes e outras personagens que povoavam o imaginário popular de então, aparecem misturados com espíritos de mortos que se opunham à doutrina e aos rituais da igreja de Roma, e que nessa noite ridicularizavam a festa de Todos os Santos com os seus próprios divertimentos e chacotas.
Parte do folclore da Halloween, tal como o conhecemos hoje, provém da emigração escocesa de 1840 para a América.
São dele as características lanternas feitas de abóboras (as Jack-O-Lanterns), inicialmente construídas a partir de nabos. Elas evocam a história do avarento Jack que não entrou no céu por esse pecado, e foi expulso do inferno por passar o tempo a pregar patifarias ao diabo. Acabou condenado a vaguear pela terra com uma candeia para alumiar o caminho.
Aos poucos, a Halloween foi-se transformando numa alegre brincadeira que todos os anos se repete, principalmente para a gente jovem.
Mas neste ano as bruxas saíram à rua mais cedo. Vejamos exemplos disso nalguns cantos do mundo.
Na Alemanha, o Partido Social Democrata (SPD) perdeu as eleições para o conservador CDU, União Democrata Cristã, e Gerhard Schröder deixa o cargo de chanceler federal que passa para a sua adversária Angela Merkel.
Em França, dezasseis ex-ministros e directores de grupos empresariais de grande porte foram processados sob variadas denúncias de suborno e gratificações. A seis deles foram aplicadas penas. Um ex-ministro da Fazenda suicidou-se ao ser acusado.
Em Portugal, a cobiçada autarquia de Sintra, perto de Lisboa, foi perdida em eleições recentes por João Soares, o candidato do Partido Socialista (PS). O pai, Mário Soares, que foi presidente da República em dois mandatos, no próprio dia das eleições apelou ao voto no seu João, o que, além de ser discutível do ponto de vista do decoro, é ilegal.
Na América, o presidente Bush esteve a braços com dois sortilégios recentes, aliás, ainda não quebrados. Primeiro, Harriet Miers, colaboradora de longa data do presidente, e sua proposta para preencher um dos lugares vagos no Supremo Tribunal, foi rejeitada pelo Congresso. Segundo, Lewis Libbly, chefe de gabinete do vice-presidente Dick Cheney, e também conselheiro do presidente, renunciou ao cargo. Ele foi acusado por um promotor federal de ter obstruído a Justiça, prestado falsas informações a investigadores policiais, e mentido sob juramento perante um júri.
Cuba, a espinha atravessada na garganta do Tio Sam, sumiu, desapareceu do mapa. Afundou-se, qual Atlântida, ou desapareceu no ar, sugada por um OVNI. Assim se explica o facto de não ter sido convidada para a Cimeira Ibero-Americana, nem para o Encontro das Américas.
No Brasil, bem... no Brasil as bruxas andam à solta desde há vários meses. Os feitiços estão bem patentes nos noticiários de imprensa, de rádio e de tv que todos os dias cativam a atenção do público.
Pessoalmente, não acredito em bruxas. Mas que elas existem, isso existem.
E para quem, como eu, no Brasil, não acredita em bruxas, digo que as bruxas podem ser vistas nos telhados dos edifícios do Senado e da Câmara dos Deputados, das assembleias legislativas estaduais, dos ministérios, dos tribunais, das polícias, dos partidos políticos, das empresas estatais, e, até, do Palácio do Planalto, sede do Governo do presidente Lula da Silva, disfarçadas de pombas que arrulham alegremente: cu-corru-pto, cu-corru-pto, cu-corru-pto.



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